Capítulo 12

Os Quatro Exílios

 

 

 “Um rio escoava do Eden para irrigar o jardim. Daí ele era dividido para formar quatro cabeças”.

(Bereshit 2:10)

 

Os nomes dos quarto rios que se dividiram e escoam do Eden são: Pishon (Bereshit 2:11), Guichon (Ibd, versículo 13), Chidekel e Perat (Ibd. versículo 14). Nossos Sábios nos revelam que estes quatro nomes são uma alusão da Torá aos quarto exílios que nosso povo passou (e ainda estamos no quarto), e assim consta no Midrash Bereshit Rabá 16:

“Não está escrito ‘para formar quatro rios’, mas ‘para formar quatro cabeças’. Trata-se dos quatro exílios, paralelamente a quatro cabeças: ‘O nome do primeiro é Pishon’ – trata-se de Bavel (Babilônia), conforme está escrito sobre ela (Chabakuk 1): ‘E eram muitos os seu cavaleiros’ (em hebraico: Ufashu parashav – ou seja a palavra Pishon, escrita como Fishon, é uma alusão á expressão de Fashú). ‘Ele circunda toda a terra da Chavilá’ – pois Bavel subiu e circundou toda a Terra de Israel, etc. (Ou seja, montou um cerco em volta dela, conforme consta no final de Yirmyáhu[1]). ‘O nome do segundo rio é Guichon’ – esta é Madai[2] (Média), com a qual Haman batia a língua qual uma cobra[3], que anda sobre o ventre (em hebraico: gachon). Chidêkel é Yavan (Grécia), que era leve e afiada (em hebraico: chadá) em seus decretos. Ela dizia a Israel: escrevam sobre os chifres do touro: ‘Não temos parte no D’us de Israel’… ‘E o quarto rio é Perat’ – trata-se de Edom (Roma e povos europeus), pois anulou (em hebraico: hefêra) e apertou os filhos de D’us”.

Por que nossos sábios compararam os quatro rios aos quatro reinados? Como as características destes rios distinguem exatamente estes reinados? Além disso, é preciso entender de maneira geral o por quê desta divisão justamente em quatro reinados (quatro exílios)?

Antes de explicarmos os quatro exílios, é preciso mencionar que há ainda outros dois exílios: o exílio do Egito, e o exílio de Yishmael (Ismael – os árabes). Começaremos explicando o exílio de Yishmael, pois esta introdução será necessária para a continuação.

 

 

*

O Exílio de Yishmael

Em Eichá Rabá 1, nossos sábios nos revelam que haverá um quinto exílio, o Exílio de Yishmael (povos árabes). O Zôhar[4] diz: “Não existe exílio mais duro a Israel que o exílio de Yishmael”. O Ramban também escreve que recebeu a tradição que este exílio terá início no sexto milênio. Assim foi: no dia 9 de Av do ano de 255 do sexto milênio ocorreu a expulsão da Espanha e, de lá, os filhos de Israel se dispersaram pelas terras de Yishmael[5].

A questão que se levanta é a seguinte: como é possível encaixar as palavras de nossos sábios – citadas no midrash Eichá e no Zohar – com todas as outras fontes nas quais nossos sábios declaram que, ao todo, serão quatro exílios e não cinco? Em Daniyel 7:3 e Zecharyá 2:1 e outras profecias só estão mencionados quatro reinados. Como é que haverá um quinto exílio, o exílio de Yishmael, aparentemente contrariando as palavras dos profetas e de nossos sábios?

O Maharal já aborda esta questão em seu livro Nêtsach Yisrael 21 e responde, baseado na guemará em Avodá Zará 2b, segundo a qual o exílio de Parás (chamado de Parás e Madai) não terminou completamente. Este retornará mais tarde, ainda antes de terminar o exílio de Edom (povos europeus), sendo que ambos os exílios coexistirão até a vinda de Mashiach. A partir disto, o Maharal explica que o exílio de Parás e Madai, em seu novo formato, é o exílio de Yishmael, que nada mais é que uma “continuação” do reinado de Parás e Madai[6].

*

Exílio do Egito

Por que nossos sábios contam quatro exílios, quando também houve o exílio do Egito? O Arizal responde[7] que o exílio do Egito era uma “primeira edição” ou “pré-estréia” de todos os exílios que viriam posteriormente, contendo dentro de si todas as quatro características dos quatro exílios. Algo como “os atos dos antepassados são uma sinalização para os filhos[8]”. Ao que tudo indica, isso está implícito nas palavras de nossos sábios em Bereshit Rabá (16,7): “Disse Rabí Yosse bar Chalafta: Todos os [quatro] exílios são chamados em nome do Egito”.

De fato, quem se aprofunda vê que há uma diferença marcante entre o exílio do Egito e os demais exílios: no primeiro, D’us revelou-Se e castigou os egípcios pelas crueldades feitas com o povo de Israel, através das Dez Pragas e do afogamento no Mar Vermelho, de forma que o exílio do Egito terminou completamente; em outras palavras: “o assunto foi encerrado”. Já em todos os demais exílios (Babilônia, Pérsia, Grécia etc), D’us ainda não castigou plenamente nossos opressores pelo sangue judeu despejado e por todas as crueldades que fizeram conosco, e mesmo que sim houve um certo castigo no entanto não foi de forma revelada e grandiosa, conforme ocorreu no Egito. D’us só terminará de “acertar as contas” com todos eles na guerra de Gog e Magog. O Alshech, o Shelá e outros explicam que todos os nossos inimigos de todas as gerações serão reencarnados na geração de Gog e Magog (conforme aludido em Daniyel 2:44) quando então se juntarão todos estes inimigos para atacar ao povo judeu (que já morará em Israel) e, então, D’us castigará todos eles de uma só vez, com milagres revelados e grandiosos mostrando que Ele é o Rei. Então concretizar-se-á o versículo: “Assim como nos dias em que saíste do Egito, mostrar-lhe-ei maravilhas”[9], pois haverá uma vingança clara e revelada assim como foi no Egito. Que assim seja, brevemente em nossos dias.

*

As três etapas da História

Concluímos então que a História do nosso povo (em relação os exílios) é dividida em três: Egito (a “primeira edição” de todos os exílios e também da salvação); os quatro reinados (sobre os quais trataram as profecias de Daniyel, o que inclui também o exílio de Yishmael); e por fim a guerra de Gog Umagog (que é a “terceira edição” dos exílios quando seremos atacados por todos os reinados de uma vez só – sendo que esta terceira fase será basicamente um grande “susto” pois então D’us revelará Seu Reinado e fará o “fechamento de contas” e a salvação final). De fato, esta divisão da História em três, fica nítida no seguinte trecho da guemará[10] (o trecho primeiramente traz um versículo e depois começa a explicar cada pedaço do versículo ao que vem aludir):

“‘Não recordem os milagres primórdios e não observem as primeiras maravilhas. Estou fazendo algo novo que agora brotará…’ (Yeshayáhu 43:18-19).

‘Não recordem os milagres primórdios’ – trata-se da subjugação aos reinados. ‘e não observem as primeiras maravilhas’ – trata-se da saída do Egito. ‘Estou fazendo algo novo que agora brotará’ – ensina Rav Yossef: trata-se da guerra de Gog e Magog

Imagine um homem que estava a caminho, quando foi atacado por um lobo e foi salvo. Passou a contar a história do lobo. Então, foi atacado por um leão e foi salvo. Passou a contar a história do leão. Então, foi atacado por uma cobra e foi salvo. Esqueceu as duas histórias de antes e passou a contar somente a história da cobra. O mesmo ocorre com o Povo de Israel: os últimos sofrimentos fazem esquecer os primeiros”.

Vemos que neste midrash, o Egito é comparado ao lobo, os quatro reinados ao leão e Gog Umagog à cobra. Qual seria o motivo? Talvez porque o lobo, quando ataca um ser humano (em vez de atacar carneiros), o faz para proteger-se e não com a intenção de se alimentar do homem. Foi isso que os egípcios fizeram, pois está explícito na Torá que escravizaram os judeus e os maltrataram devido à seguinte preocupação: “Sejamos mais espertos que eles. De outro modo, eles podem aumentar tanto que, se houver uma guerra, eles se juntarão aos nossos inimigos e lutarão contra nós, (nos) expulsando da terra”[11]. Já o leão, quando ataca um ser humano, não o faz para se proteger; está interessado no próprio ataque para comer a carne da presa. Assim, os quatro reinados que perseguiram o povo de Israel tinham o intuito de subjugá-lo ou mesmo aniquilá-lo por ódio profundo[12].

Já a cobra, segundo o explicado no tratado de Taanit 8a, não tira vantagem nenhuma de seu ataque, que não tem um objetivo real: nem proteção, como o lobo, nem alimentação, como o leão. Ela ataca o homem simplesmente devido ao decreto Divino: “E você o golpeará no calcanhar” (Bereshit 3:15). Assim será a guerra de Gog e Magog. O presidente Gog por si próprio não desejará sair para a guerra; só o fará porque D’us interferirá dentro de seus pensamentos e o levará a guerra, para nesta ocasião puni-lo por todos os seus feitos nas encarnações anteriores, conforme consta em Yechezkel 38:4: “Eu te iludirei, porei anzóis nas tuas mandíbulas”. Explica Rashí: “costuma-se puxar os animais pelas mandíbulas, pois não querem sair. D’us também colocará em seu coração pensamentos e vontades que o atraiam de sua terra para vir à Terra de Israel”.

*

Quatro tipos de sofrimento

Uma vez que o exílio do Egito é uma espécie de sinalização para os filhos quanto aos quatro exílios que estão por vir, incluindo dentro de si uma “miniatura” dos quatro exílios futuros, vamos nos aprofundar um pouco neste exílio. Desta forma, conseguiremos entender a essência das quatro características dos quatro reinados.

Na fornalha de ferro do Egito, o sofrimento do Povo de Israel não se limitou somente ao trabalho árduo, mas a quatro tipos de sofrimento que o acompanhavam, explicados no versículo[13]: “D’us ouviu nossa voz e viu nosso sofrimento, nosso esforço e nossa pressão”. A Hagadá explica:

“‘D’us ouviu nossa voz’ – conforme escrito: ‘Os filhos de Israel suspiraram devido ao trabalho e gritaram…’. ‘E viu nosso sofrimento’ – significa a abstenção conjugal… ‘E nosso esforço’ – trata-se dos filhos, conforme escrito: ‘O Faraó ordenou a todo o seu povo: todo varão que nascer, joguem-no dentro do Nilo…’. ‘E nossa pressão’ – é o aperto, conforme escrito: ‘Também vi o aperto que o Egito os está apertando’”.

Existem, no mundo, quatro tipos de sofrimento[14]:

1) Sofrimento do corpo, como fome, cansaço, dor. 2) Sofrimento da mente, como alguém que descobre que sua vida corre perigo, mesmo que esteja são e salvo naquele momento. 3) Sofrimento emocional, como alguém que fica ofendido, ou descobre que não é amado por alguém. 4) Sofrimento psicológico: trata-se de um sofrimento intermediário entre a mente e o sentimento. Por exemplo: alguém que é preso, mas goza das melhores condições possíveis (como prisão domiciliar). O fato de saber que está preso é angustiante. Ou um milionário que perdeu metade de suas posses. Ele ainda dispõe de muito dinheiro e pode viver farta e respeitosamente pelo resto da vida, da mesma forma que antes. Mesmo assim, sofre muito[15].

Conforme consta no trecho da Hagadá citado acima, o Povo de Israel no Egito passou por todos estes tipos de sofrimento: 1) o trabalho pesado era o sofrimento do corpo. 2) A abstenção era um sofrimento emocional (pois o principal sofrimento não é físico mas sim a perda da ligação entre o casal). 3) O decreto de lançar todos os varões ao Nilo era um sofrimento mental, pois sabiam, o tempo todo, que a vida de seus filhos corria perigo (e nossos sábios explicam[16] que, na prática, eles não foram atingidos, pois os anjos salvavam as crianças e as alimentavam com leite e mel até crescerem. Mesmo assim, os pais experimentavam um terrível sofrimento mental). 4) O aperto que os egípcios os apertavam: os filhos de Israel tinham uma cota fixa de tijolos que precisavam fazer por dia. Caso não conseguissem terminar a cota, seus bebês eram usados como substitutos para os tijolos[17]. Este “aperto” das cotas era um terrível sofrimento psicológico, o conhecido “estresse”. Muitas vezes é maior que o sofrimento físico do próprio trabalho.

Assim, os filhos de Israel foram purificados por todas as espécies de sofrimento existentes. É por isso que foram redimidos com as quatro expressões de redenção, paralelamente aos quatro tipos de escravidão.

Pagando na mesma moeda, os egípcios também foram castigados com quatro tipos de sofrimento, conforme diz Rabí Eliezer: cada praga que D’us trouxe sobre os Egípcios no Egito era composta de quatro[18]. Exemplifiquemos com a praga do sangue: 1) Até descobrirem que era possível comprar água dos judeus, os egípcios sofreram tremenda sede: sofrimento físico. 2) Sentiram-se em perigo de vida por falta de água: sofrimento mental. 3) Os egípcios foram obrigados a se humilhar e suplicar aos “escravos” que lhes vendessem um pouco de água. Além disso, o Nilo, seu deus, foi humilhado e transformado num líquido asqueroso: sofrimento emocional. 4) Perderam muito dinheiro com a compra de água e a morte dos peixes. Conforme já vimos, perda de dinheiro se enquadra em sofrimento psicológico.

Agora, podemos entender melhor a “segunda edição” do exílio do Egito, ou seja: os quatro reinados. Estes quatro exílios foram quatro tipos de purificação pelos quais passou o Povo de Israel no decorrer das gerações, para levá-lo à reparação final nos dias do Mashaiach, conforme explicarei, com a ajuda de D’us[19].

 

*

O Exílio da Babilônia

Citemos novamente parte do Midrash com o qual começamos:

“‘O nome do primeiro é Pishon’ – trata-se de Bavel (Babilônia), conforme está escrito sobre ela (Chabakuk 1): ‘Ufashu parashav’. ‘Ele circunda toda a terra da Chavilá’ – pois Bavel subiu e circundou toda a Terra de Israel, etc.”

O Midrash está nos descrevendo que a principal característica dos babilônios foi a conquista da Terra de Israel. De fato, a aspiração dos babilônios era de “conquistar” e “dominar” Israel, levando seu povo como prisioneiro. Não tinham interesse em matá-los ou convertê-los à força.

Isto se perecebe tambem de outro midrash, o Bereshit Rabá[20] sobre o versículo que Yitschak disse a Essav: “E agora, pegue seu equipamento, seu laço e arco…”[21], lá o midrash atribui cada parte deste versículo a um dos quatro reinados, e no que diz respeito a Babilônia diz o seguinte: “‘Pegue suas armas’ – é a Babilônia, sobre quem está escrito: ‘E os utensílios [do Templo] levou à casa de tesouro de seu deus’[22]” – Vemos que este reinado é caracterizado pela conquista: pegar, levar. Esta era a essência de Nevuchadnetsar (Nabucodonosor) o imperador da Babilônia, sobre o qual contam nossos Sábios que ele comia lebres vivas[23], mesmo que era rei e dispunha de todas as regalias do mundo, ou seja tratava-se de seu desejo de “conquistar”, subjugar, pegar.

Na profecia de Daniyel (7:4), o reinado da Babilônia é comparado ao leão, uma vez que este simboliza o domínio e é o rei dos animais[24]. O leão ataca a presa e a devora quando esta ainda vive, diferentemente de outros animais que matam e só depois devoram. Assim como fazia Nevuchadnetsar.

Quando os babilônios conquistaram a Terra de Israel, nosso povo, com certeza, passou por todos os quatro tipos de sofrimento. Mesmo assim, o principal ponto neste exílio foi o sofrimento psicológico. O próprio conceito de exílio, sem os sofrimentos que o acompanham, é definido como sofrimento psicológico. De fato, depois que o Povo de Israel chegou à Babilônia, seu estado material e espiritual não estava dos piores. Os judeus fundaram Yeshivot e ocuparam-se da Torá. Afinal, a ênfase do exílio da Babilônia era o fato de que a Terra de Israel e o Povo de Israel foram conquistados. Nisto, a principal característica é o sofrimento psicológico.

*

O Exílio da Pérsia/Média

“‘O nome do segundo rio é Guichon’ – esta é Madai (Média, e isto inclui também a Pérsia que juntos formavam um reinado chamado de Parás e Madai), com a qual Haman batia a língua qual uma cobra, que anda sobre o ventre (gachon)”.

Neste exílio basicamente nada aconteceu. Afinal, os judeus já tinham sido exilados de sua terra pelos babilônios. Na prática, os medas e persas não mataram os judeus nem os converteram à força. O principal sofrimento deste exílio foi o sofrimento mental, o medo de morrer. Haman decretou o extermínio de todo o povo e tinha o poder para levar a cabo sua “solução final”. Na prática, porém, seus planos não se realizaram nem mesmo parcialmente. É isso que significa “Haman batia a língua qual uma cobra”: sua principal forma de “bater” em Israel foi com a ação da língua: a declaração de extermínio. O sofrimento de Israel veio por meio da fala de Haman e, graças a D’us com Sua imensa bondade conosco, sua trama não foi implementada.

Já no Midrash Rabá acima citado sobre o versículo “E agora, pegue seu equipamento, seu laço e arco…”[25], nossos sábios dizem: “‘Seu arco’ – significa a Média, sobre a qual foi escrito: ‘Penduraram Haman na viga’”. Na maioria dos reinados, a sentença de morte dá-se por meio da espada, enquanto na Pérsia e na Média sempre encontramos a morte pendurando na forca, como ocorreu com Bigtan e Têresh, os dez filhos de Haman e assim por diante. O motivo é que, por meio do enforcamento, o reinado impõe medo sobre os transgressores, que podem ver o corpo do réu pendurado aos olhos de todos. Esta é a principal característica do reinado da Pérsia e da Média: impor medo. O midrash acima declara que a principal essência da Pérsia e da Média era impor medo. Além disso, enfatiza que este reinado não nos causou nenhum mal na prática, e Haman acabou sendo enforcado em vez de Mordechai. Por isso, o principal sofrimento de nosso povo foi o medo e a preocupação por sua vida – sofrimento mental.

Na profecia de Daniyel (7:5), o reinado da Média é comparado ao urso. De fato, este animal tem a característica de amedrontar, levantando-se e bramindo a plenos pulmões. No Tanach, o urso é sempre trazido como um animal que grita[26]. No perek Shirá, o urso diz: “Da ponta das rochas gritarão”. É isso que significa “bater com a língua”.

Trouxemos, acima, as palavras do Maharal, segundo as quais o exílio da Pérsia e da Média retornará (e já retornou) com novo nome: o exílio de Yishmael de nossos dias. De fato, vemos que toda a força do reinado de Yishmael é o medo. O objetivo dos ataques terroristas não é matar dez ou vinte pessoas, mas introduzir um medo constante no coração de todo o povo. Esta, de fato, é a essência de Yishamel, pai deste povo, pois consta no Midrash[27] que Yishamel atirava flechas em direção a Yitschak sem feri-lo, só para amedrontá-lo.

Não é de se admirar que, quando os filhos de Yishmael conseguem pôr a mão em um judeu, cortam-no em pedaços e os mostram às câmeras de vídeo, uma conduta muito indecente mesmo aos olhos dos maiores assassinos. Fazem como os persas e os medas, que penduravam os condenados à morte para que todos vissem. O mesmo faz o urso, diferentemente de outros animais: corta em pedaços todo o corpo da presa.

*

O Exílio da Grécia

“Chidêkel é Yavan (Grécia), que era leve e afiada (chadá) em seus decretos. Ela dizia a Israel: escrevam sobre os chifres do touro: ‘Não temos parte no D’us de Israel’”…

Os gregos não exilaram os judeus de sua terra nem os mataram. Sua principal atuação foi no sofrimento emocional, pois queriam extirpar de Israel qualquer coisa que os alegrasse. Desta forma, perderiam a doçura das mitsvot e seria mais fácil para eles serem arrastados pela cultura grega. Por isso, os gregos proibiram a observação do Shabat (para que não tivessem o prazer do Shabat), proibiram a observação do início dos meses, de forma que nenhuma festa judaica existisse (pois todo o calendário judaico e suas festividades dependem de quando é o Rosh Chodesh), e proibiram a circuncisão, que é o maior exemplo da mitsvá realizada com alegria, conforme consta no Tratado de Shabat 130a: “Toda mitsvá que o Povo de Israel aceitou com alegria – como a circuncisão, por exemplo, conforme escrito ‘alegro-me com Suas palavras como alguém que encontra um grande tesouro’ – ainda a cumpre com alegria”. Além destas proibições, decretaram que sempre que houvesse um casamento, a noiva precisaria passar a primeira noite com o governador grego do local[28], transformando toda a alegria do casamento em luto e sofrimento. Este é o motivo pelo qual os gregos faziam questão de lembrar os judeus constantemente do pecado do bezerro de ouro, obrigando-os a escrever num chifre de boi “não temos parte no D’us de Israel”[29]. Ou seja, queriam tirar-lhes toda a motivação, entristecê-los e desencorajá-los, de forma que ficassem mais vulneráveis aos valores que vinham de fora.

Assim, os decretos dos gregos eram bem dirigidos aos objetivos por eles estipulados. Do ponto de vista material, os decretos eram relativamente “leves” em comparação aos demais reinados, conforme o midrash afirma: “a Grécia era leve e afiada em seus decretos”.

Na profecia de Daniyel (7:6), o reinado da Grécia é comparado ao leopardo. Este animal é destacado por sua ousadia, conforme nossos sábios dizem: “Seja ousado como o leopardo”. Ousadia significa barrar os sentimentos para chegar a um objetivo definido.

*

O Exílio de Edom

“‘E o quarto rio é Perat’ – trata-se de Edom, pois anulou (hefera) e apertou os filhos de D’us”.

Esta é a principal característica do exílio de Edom: anular e apertar, ou seja, sofrimento físico: Inquisição, pogroms, Holocausto. Esta era a vontade de Essav, pai do povo de Edom: matar Yaacov[30], pai do povo de Israel. Nossos sábios[31] descrevem que, quando D’us ofereceu a Torá aos filhos de Edom, estes recusaram-se a recebê-la, alegando que não eram capazes de aturar o mandamento “Não mate”.

O nome “Edom” foi dado a este povo devido à cor vermelha[32], que simboliza o derramamento de sangue. Os descendentes de Essav são os países europeus[33] (o que inclui seus descendentes – os norte americanos[34]). É espantoso notar que o elemento comum entre as bandeiras da maioria absoluta dos países europeus[35], bem como norte americanos, é o seguinte: a cor vermelha. O interessante é que mesmo bandeiras que contêm somente duas cores escolheram o vermelho como uma delas. A bandeira da Rússia Soviética era totalmente vermelha e, mesmo na bandeira atual, após a queda do comunismo, não abriram mão do vermelho. Nota-se que a Grécia, embora localiza-se no continente Europeu, é o povo de Yavan e não de Edom, e portanto sua bandeira é azul claro e branco.

Na profecia de Daniyel, o reinado de Edom é comparado a um monstro aterrorizante de dez chifres e dentes de ferro que devora, pisoteia e esmigalha com seus pés (descrição que parece mais uma máquina do que um animal). Vemos aqui uma referência que enfatiza características assassinas.

*

Outras Comparações de Nossos Sábios

Até aqui aprendemos que, no decorrer das gerações, nosso povo santo vem sendo purificado por todos os quatro tipos de sofrimento impingidos pelos quatro reinados, até chegar à reparação final nos dias de Mashiach ben David, que seja brevemente em nossos dias. Amen.

À luz do que foi dito, é possível entender um midrash[36] onde esta trazida a seguinte idéia: O reinado de Bavel é antagônico à tribo de Yehudá e, por isso, caiu nas mãos de Daniyel, que pertencia a esta tribo. O reinado da Média é antagônico à tribo de Binyamin e, por isso, caiu nas mãos de Mordechai, que era desta tribo. O reinado da Grécia vem em contrapartida à tribo de Levi e por isso caiu nas mãos dos Chashmonaim, que eram desta tribo. Já o reinado de Edom é antagônico à tribo de Yossef e, por isso, cairá brevemente, em nossos dias, nas mãos de Mashiach ben Yossef.

A explicação disso tudo é a seguinte: Yehudá é a força do poder e do governo: “O cetro não se moverá da tribo de Yehudá” [37]. Como vimos, a essência da Babilônia era conquistar e dominar, portanto Yehudá possui justamente a força de santidade que é antagônica a força impura da Babilônia. Binyamin é o personagem na Torá pelo qual todos temem e se preocupam para que nada de mal lhe aconteça. A essência da Média e da Pérsia é aterrorizar e assustar, sendo então Binyamin a força antagônica a esta essência. O principal papel de Levi é cantar e tocar no Templo. Rabenu Bachyê explica que o objetivo desta música é trazer alegria ao serviço Divino. Por isso, justamente a tribo de Levi é que tinha a força espiritual necessária para enfrentar o reinado da Grécia, que desejava extirpar qualquer sentimento de alegria e doçura do serviço Divino. Yossef é o irmão que mais sofreu e é aquele que lutou para dominar seu próprio corpo. É por isso que ele é que possui a força antagônica a Edom, cuja essência é fazer o corpo sofrer.

Que seja a vontade do Criador que em breve termine exilio, com a salvação final, e a revelação do Seu Reinado no mundo, amen sela!

 

 

[1]  Assim explica o Maharip.

[2] Em alguns lugares nossos sábios denominam este exílio como “Parás” (Pérsia). De fato, Parás e Madai são um só reinado formado por duas nações semelhantes.

[3]  De acordo com a explicação do Maharzu e do Ets Yossef.

[4] Parashat Shemot, daf 17a.

[5] Já o Arizal, no livro Ets Hadáat Tov (Tehilim 124), escreve que o exílio de Yishmael começará somente no final dos tempos. Subentende-se que mesmo que na época do Arizal já se vivia nas terras de Yishmael, este fato não significava um novo exílio, pois naquela época se vivia relativamente em paz entre os árabes. Sendo assim, parece que o midrash Eichá, que diz que haverá o Exílio de Yishmael, está se referindo à situação pela qual estamos passando hoje em dia na Terra de Israel (Aliás, as palavras do Arizal são uma prova de que nossa época é denominada “fim dos tempos” – ou seja as décadas próximas a Era Messiânica).

[6] De fato, existe uma grande semelhança entre a natureza de Parás e Madai e o estilo do Exílio de Yishmael. No exílio de Parás e Madai, as desgraças dos judeus vieram por intermédio de um descendente de Edom – Haman – pois Achashverosh não teria conseguido fazer nada sem o seu auxílio. Embora Haman fosse um ministro no exílio de Parás e Madai, ele era descendente de Agag, rei de Amalek, da linhagem de Edom. Da mesma forma, os filhos de Yishmael só fazem mal para Israel com a ajuda de Edom, conforme a história dos odres cheios de ar no Talmud Yerushalmi (Taanit 4:5). Hoje, também, as conquistas de Yishmael devem-se sempre à pressão dos países de Edom.

[7] Em seu livro Likutê Torá, Parashat Shemot, sobre o versículo “Vayômer Par’ô mi Hashem” e parashat Tetsê, sobre o primeiro versículo.

[8]  Vide Bereshit Rabá 70 6..

[9] Michá 7:15.

[10] Berachot 13a.

[11] Shemot 1:10.

[12] Isso não contradiz o que foi mencionado antes, que o Egito é uma pré-edição dos próximos quatro exílios. Pode ser que o objetivo dos egípcios fosse diferente das metas dos demais povos, mas do ponto de vista dos judeus, não faz diferença o que levou cada povo a agir; basta que foi um exílio amargo para servir como sinalização para os filhos quando chegarem os quatro exílios.

[13] Devarim 26:7.

[14] Isto foi explicado em meu livro (editado em português) a Hagadá “Chezur Veshoshan”.

[15] Talvez estes quatro tipos de sofrimento sejam paralelos às sanções estabelecidas pela Torá àquele que fere seu próximo (Báva Cáma, cap. Hachovel): Nêzek (pagar pelo prejuízo), tsáar (pagar pelo sofrimento), shêvet (pagar pelos dias em que o ferido não pôde trabalhar) e bôshet (pagar pela vergonha). (A obrigação de curar o ferido não passa de algo técnico para fazer com que o ferido fique bom como antes; já as demais sanções não servem para fazer a situação voltar ao que era antes, e sim para compensar a situação do presente.) Não podemos nos estender muito nisso, porque a compreensão deste assunto depende do esclarecimento da definição haláchica dos quatro pagamentos citados. Em todo caso, explicaremos de forma muito resumida: Tsáar é paralelo ao sofrimento do corpo. Bôshet é paralelo ao sofrimento emocional. Nêzek é paralelo ao sofrimento psicológico (pois conforme explicamos, o prejuízo monetário que vai além do sustento é considerado sofrimento psicológico, e aqui no caso a pessoa tem que repor o prejuízo monetário). Shêvet é paralelo ao sofrimento mental (pois seu objetivo é assegurar o mínimo necessário para a sobrevivência da pessoa, e já explicamos que o perigo que paira sobre a vida da pessoa é sofrimento mental).

[16] Sotá 11b.

[17] Vide San’hedrin 101b e Rashí, começando pela palavra nitmachmech.

[18] Rabí Akiva acrescenta um quinto sofrimento, que é o sofrimento da alma. De qualquer forma, no plano material há quatro tipos, e ambos estão corretos.

[19] De qualquer forma, saiba que tudo o que explicaremos sobre cada reinado é em relação à linha principal e à característica essencial. No entanto, é lógico que, em cada exílio, havia uma “degustação” de todas as outras espécies de sofrimento.

[20] 65:8.

[21] Bereshit 27:3.

[22] Daniyel 1:2.

[23] Tratado de Nedarim 65a.

[24] Chaguigá 13b.

[25] Bereshit 27:3.

[26] em Mishlê 28:15 e em Yeshayáhu 59:11.

[27] Bereshit Rabá 53.

[28]  Otsar Hamidrashim Pág. 192.

[29] Conforme a explicação de Rashí sobre este midrash.

[30]  Bereshit 27:41.

[31] Sifri, Vezot Haberachá.

[32] Bereshit 25:30.

[33] Conforme escrevem o Abarbanel, o Maharal e outros. Além disso, como é sabido, Essav e Yeshu, em hebraico, têm exatamente as mesmas letras.

[34] A América Central e a América do Sul não estão inclusas, pois seus povos são uma mistura de europeus com índios e negros.

[35]  Como: Alemanha, França, Inglaterra, Holanda, Suíça, Espanha, Itália, Portugal, Hungria, Bélgica, Áustria, Dinamarca, Polônia, Bulgária, Lituânia, Tchéquia, Islândia, Letônia, Macedônia, Luxemburgo, Jersey, Malta, Eslovênia, Romênia, Ilhas Feroe, Albânia, Andorra, Lichsteinstein, Montenegro, Mônaco, a Ilha de Man, Gibraltar, Sérvia, Geórgia e Moldava. Os nomes dos países foram citados para enfatizar como não pode ser acaso que tantos países tenham escolhido a mesma cor. Com certeza há um motivo.

[36] Bereshit Rabá 99, 2 (e no Tanchumá Vayechi 14).

[37]  Bereshit 49:1.

Translate »
MIGDAL GOOD